Diástase abdominal: o que é e como tratar

Diástase abdominal: entenda o que é, sintomas e opções de tratamento eficaz, desde exercícios até cuidados no pós-parto. Saiba como recuperar seu abdome.

9/29/202510 min read

O Vazio que Ninguém Vê: Diástase Abdominal Pós-Parto e a Sensação de Negligência


Seu bebê nasceu, o mundo ganhou novas cores, e a alegria da maternidade preenche cada minuto. Vocês estão bem, e isso é o que mais importa! Até que um dia, passados alguns meses do nascimento do seu filho(a), você faz um movimento simples – tenta levantar da cama para sentar-se – e nota que ao fazer o esforço, um cone, uma elevação ou uma "montanha" salta para fora do seu abdome. Você toma um susto e o pensamento vem como um raio: “Isto é normal? Alguma coisa quebrou em mim?”

Se você se identificou com essa cena, saiba que você não está sozinha. Essa protuberância estranha, frequentemente chamada de “barriga de cone” ou “telhadinho”, é uma manifestação da Diástase Abdominal (Diástase dos Retos Abdominais – DRA), a separação dos músculos abdominais.

Para nós, mães que vivemos essa realidade, queremos que se sintam acolhidas. A diástase vai muito além da estética: ela afeta a autoestima, causa desconfortos físicos e, como veremos na ciência mais recente, é cercada por uma dolorosa sensação de negligência por parte dos profissionais de saúde.

O objetivo aqui é reforçar o tema das pesquisas qualitativas que destaco aqui com muito prazer pela tamanha sensibilidade em retratar esta realidade de forma melhor descrita, reforçando a fala do personagem central que são as mulheres que sofrem o impacto da diástase. Estudos de 2024 e 2025, como os de Fitzpatrick et al. (2024), Marander et al. (2024) e Jessen et al. (2025), estão lançando uma luz crucial sobre a experiência vivida dessas mulheres. Estes trabalhos recentes mostram que:

  1. A DRA tem um impacto físico, emocional e social profundo.

  2. Muitas mulheres sentem-se negligenciadas e encontram grandes barreiras para o tratamento, mesmo buscando ajuda.

Neste texto, vamos mergulhar na ciência mais atual para validar sua experiência, oferecer informações claras e, o mais importante, dar voz ao “vazio” que muitas sentem, tanto no abdome quanto no apoio profissional. Que tal transformar a experiência das mães em evidência para uma assistência à saúde mais empática e baseada em dados? Continue lendo para entender o que a ciência de 2024 e 2025 está revelando sobre a Diástase Abdominal.

O que é diástase abdominal?

A diástase abdominal é uma condição comum que ocorre durante ou após a gravidez, em que os músculos retos abdominais, que normalmente ficam juntos, se separam no meio. Esses músculos são os responsáveis por formar a "linha do meio" do abdômen, e eles se afastam devido ao crescimento do útero, que empurra para fora a parede abdominal. Quando a separação é grande demais e não se fecha naturalmente após o parto, essa condição é chamada de diástase do reto abdominal (DRA).

Durante a gravidez, o seu corpo passa por várias mudanças, e o útero se expande para acomodar o bebê. Esse crescimento acaba fazendo com que os músculos abdominais se estiquem, e isso pode causar a separação. Para muitas mulheres, a separação dos músculos ocorre de forma temporária, e com o tempo, esses músculos podem se juntar novamente após o parto, dentro de 3 a 6 meses (não é uma regra, mas é uma estimativa). No entanto, para outras, essa separação pode continuar, levando à diástase abdominal pós-parto.

Os sintomas mais comuns da diástase incluem uma sensação de fraqueza ou falta de suporte no abdômen, como se a barriga estivesse "caindo". Algumas mulheres relatam uma sensação de "bolo" ou de que algo não está certo no estômago, especialmente na parte inferior da barriga. Você também pode sentir dor nas costas, dificuldades para fazer certos movimentos ou até problemas com a digestão, como inchaço ou constipação. A diástase abdominal pode afetar a sua capacidade de fazer atividades físicas, já que você pode sentir desconforto ou até ter dificuldade para realizar certos movimentos, como levantar peso ou fazer abdominais.

É importante saber que diástase abdominal não é um problema raro e que muitas mulheres passam por isso, especialmente após o parto. No entanto, a boa notícia é que exercícios específicos e a fisioterapia podem ajudar a fortalecer os músculos e melhorar a condição. Às vezes, em casos mais graves, a cirurgia pode ser recomendada para corrigir a separação.

Se você está sentindo sintomas como esses, é uma boa ideia conversar com seu médico ou fisioterapeuta especializado, pois eles podem ajudá-la a entender melhor a sua situação e indicar o tratamento mais adequado para o seu caso. O mais importante é que a diástase abdominal pode ser tratada, e com os cuidados certos, você pode melhorar a sua saúde e qualidade de vida pós-parto.

Pessoas não grávidas podem ter diástase?

A diástase não é uma condição restrita às gestantes, mas pode afetar qualquer pessoa que tenha fatores de risco, como excesso de peso, idade avançada ou má postura durante atividades físicas. Se você tem algum desses fatores, é importante prestar atenção ao fortalecimento da musculatura abdominal e buscar orientação profissional caso sinta sintomas ou desconfortos. Veja alguns fatores de risco:

  1. Gestantes e puérperas: Durante a gravidez, à medida que o útero cresce, a pressão sobre a parede abdominal aumenta, o que pode causar a separação dos músculos retos abdominais. Após o parto, a condição pode persistir, especialmente se a separação foi significativa.

  2. Homens com sobrepeso ou obesidade: O aumento da pressão abdominal devido ao excesso de peso pode levar à separação dos músculos, causando a diástase. A gordura abdominal exerce pressão sobre a parede do abdômen, o que pode causar o afastamento dos músculos retos.

  3. Praticantes de exercícios de alta intensidade: Quando exercícios pesados são feitos sem um bom controle do core (a musculatura central do corpo), como levantamento de peso ou treinos de alta intensidade, pode haver sobrecarga na região abdominal, resultando em diástase. Isso é particularmente comum se os músculos do abdômen não forem trabalhados de forma adequada.

  4. Idosos: Com o passar dos anos, ocorre uma perda natural de tônus muscular e elasticidade do tecido conjuntivo, o que pode fazer com que os músculos abdominais se separem. A diástase pode surgir em função dessa perda de força e firmeza na parede abdominal, especialmente se o idoso tiver uma postura comprometida ou tiver ganho de peso.

Sintomas da diástase abdominal

Nem sempre a diástase causa dor, por isso muita gente só descobre quando observa a barriga de perto. Alguns sinais comuns incluem:

  • Abaulamento (barriga que “salta”) ao contrair o abdome ou levantar da cama.

  • Sensação de fraqueza no abdome ou instabilidade na região central do corpo.

  • Dores na lombar (porque a musculatura abdominal não está dando suporte suficiente).

  • Alterações posturais (acabar assumindo uma posição mais cifótica, ou de hiperlordose lombar).

  • Em alguns casos, desconforto pélvico ou até sintomas urinários, pela sobrecarga no assoalho pélvico.

Como avaliar a diástase sozinha?

Uma maneira simples de avaliar se você pode ter diástase abdominal é fazendo um teste caseiro. Siga estas etapas: 

  1. Posição Inicial: Deitar de costas (decúbito dorsal), joelhos dobrados e pés no chão. (Conforme a imagem de referência com a boneca).

  2. Localização: Colocar dois dedos (indicador e médio) logo acima do umbigo, na linha central do abdômen (a linha alba).

  3. Ação para Teste: Elevar levemente a cabeça e os ombros (como no início de um crunch ou abdominal), contraindo os músculos.

  4. Avaliação: Sentir a área com os dedos. A "lacuna" ou "afastamento" que você consegue sentir entre os músculos retos abdominais contraídos é o indicativo da diástase.

  5. Resultado Sugerido: Se for possível inserir dois ou mais dedos, sugere-se a presença de diástase abdominal.

⚠️ Importante: Esse autoexame pode indicar a presença de diástase, mas apenas um profissional de saúde (fisioterapeuta ou médico) pode fazer a avaliação definitiva, medindo corretamente a extensão e a profundidade da separação. Para uma avaliação mais precisa, com quantificação da extensão da separação dos retos, é utilizado o exame de imagem como a ultrassonografia.

                Fonte: imagem meramente ilustrativa, criada com IA, para ilustrar o passo a passo do autoexame. 

A diástase sempre precisa de cirurgia?

Não, a diástase abdominal nem sempre precisa de cirurgia. O tratamento depende da gravidade da separação, dos sintomas que a mulher apresenta e dos objetivos de tratamento. Na maioria dos casos, a diástase abdominal pode ser tratada de maneira conservadora (sem cirurgia), com fisioterapia e exercícios específicos para fortalecer os músculos abdominais e melhorar a função do core. A fisioterapia tem como objetivo melhorar a estabilidade e o controle muscular, além de ajudar a reduzir a dor e o desconforto associados à condição.

A cirurgia pode ser considerada quando:

  1. Diástase severa e sintomática: Se a separação dos músculos for grande (geralmente mais de 4 cm) e a mulher continuar a sentir dor, fraqueza ou dificuldades funcionais significativas, a cirurgia pode ser recomendada para corrigir a separação e restaurar a função dos músculos.

  2. Impacto na qualidade de vida: Se a diástase estiver prejudicando a qualidade de vida, tornando atividades diárias, como levantar objetos ou praticar exercícios, extremamente difíceis ou dolorosas, a cirurgia pode ser uma opção.

  3. Falta de resposta ao tratamento conservador: Se, após meses de fisioterapia e exercícios específicos, a diástase não apresentar melhora significativa e os sintomas persistirem, a cirurgia pode ser indicada, especialmente se a mulher desejar restaurar a estética abdominal ou resolver problemas funcionais.

  4. Problemas relacionados à diástase: Se houver complicações associadas à diástase, como dor lombar crônica, incontinência urinária ou dificuldades digestivas (como sensação de inchaço e constipação), e os tratamentos conservadores não forem eficazes, a cirurgia pode ser considerada.

Tipos de cirurgia:

Quando a cirurgia é necessária, o procedimento mais comum é a abdominoplastia, que é uma cirurgia que reconecta os músculos abdominais e remove o excesso de pele. Em casos mais graves, pode ser necessária uma cirurgia reconstrutiva específica para fechar a separação dos músculos reto-abdominais.

Em resumo, nem todas as mulheres com diástase abdominal precisam de cirurgia. A decisão depende da gravidade da separação, dos sintomas que a mulher apresenta e da resposta ao tratamento conservador. A cirurgia é indicada apenas quando a diástase causa desconforto significativo ou quando outras abordagens não foram eficazes.

Como tratar?

O tratamento conservador para a diástase abdominal é a primeira linha de abordagem e, na maioria dos casos, pode ser eficaz na redução da separação dos músculos e no alívio dos sintomas. O objetivo é fortalecer os músculos abdominais, melhorar a postura e restaurar a função do core, sem a necessidade de cirurgia. Aqui estão as melhores estratégias conservadoras:

🧑‍⚕️Fisioterapia especializada

A fisioterapia pélvica e abdominal é o tratamento mais indicado e eficaz para a diástase abdominal. O fisioterapeuta especializado irá:

  • Ensinar exercícios específicos que visam fortalecer os músculos abdominais profundos, especialmente o músculo transverso abdominal e os músculos do core. Isso ajuda a diminuir a separação dos músculos retos abdominais.

  • Reeducação postural: Melhorar a postura pode aliviar a pressão sobre a parede abdominal e ajudar no processo de recuperação.

  • Técnicas de respiração: Ensinar o uso de respiração controlada e contração do core (como na respiração diafragmática) para evitar a pressão excessiva na região abdominal.

🏋️ Exercícios específicos para o core

Não basta fazer abdominal comum (na verdade, isso pode até piorar!). O tratamento envolve exercícios que:

  • Reforçam a musculatura profunda do abdome (transverso abdominal).

  • Trabalham sinergia entre abdome e assoalho pélvico.

  • Estimulam o controle da respiração (método hipopressivo, por exemplo, pode ser associado).

🎯 Treino funcional e progressivo

Após a ativação da musculatura profunda, é possível evoluir para exercícios funcionais: agachamentos, pranchas adaptadas e movimentos integrados que simulam atividades do dia a dia.

🤱 Cuidados no pós-parto
  • Evitar levantar da cama de frente (prefira o “rolar de lado” para proteger a parede abdominal).

  • Usar faixas ou taping abdominal, se indicado pelo profissional.

  • Retomar a atividade física gradualmente, com acompanhamento.

👨‍⚕️ Orientação especializada

Um fisioterapeuta especializado em saúde pélvica pode montar um protocolo individualizado, incluindo:

  • Exercícios terapêuticos personalizados.

  • Biofeedback.

  • Técnicas manuais para ativação da fáscia e da musculatura.

  • Educação postural e funcional.

O que não fazer se tenho diástase?

  • Evitar abdominais tradicionais (crunches) sem orientação.

  • Não realizar exercícios de alto impacto logo no início do tratamento.

  • Evitar prender a respiração durante esforços (isso aumenta a pressão abdominal).

  • Não ignore os sinais de instabilidade ou dor.

Quando procurar ajuda?

Se você percebeu:

  • Que sua barriga continua “saltada” meses após o parto;

  • Que sente dor lombar frequente;

  • Ou que atividades simples ficam desconfortáveis…

👉 É hora de procurar um fisioterapeuta especializado em saúde da mulher ou do homem. Quanto antes começar, melhor a resposta.

Recapitulando

A diástase abdominal é comum, mas não deve ser normalizada como “sem solução”. Embora muitas vezes seja vista apenas como uma questão estética, ela pode impactar o bem-estar físico, a postura e até a qualidade de vida.

O bom é que a maioria dos casos pode ser tratada com exercícios específicos, acompanhamento fisioterapêutico e ajustes no dia a dia. E, em casos mais graves, existem recursos cirúrgicos seguros.

Se você suspeita de diástase, não ignore! Informação é poder, e buscar ajuda especializada é o primeiro passo para recuperar a força, a confiança e o equilíbrio do corpo.

Referências:
  • Fitzpatrick SE, et al. Australian women’s experiences of post-partum rectus diastasis: A qualitative study. Women’s Health. 2024;20:1-11.

  • Jessen ML, et al. Women with Rectus Diastasis Feel Neglected by Health Professionals: A Qualitative Interview Study. 2025.

  • Marander V, et al. Mothers' experiences living with diastasis recti abdominis. 2024.

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